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No futuro, as catástrofes de Verão poderão vir a ser normais

por Helena Geraldes e Nicolau Ferreira

A onda de calor que hoje fustiga a Rússia pode ser comparável à do Verão quente de 2003 no Sul da Europa, que só em Portugal fez 1316 mortes. As temperaturas extremas russas, causadas por um anticiclone fora de tempo, conjugam-se com as chuvas no Paquistão, China e Europa Central para desenhar um quadro meteorológico hoje fora do comum. Mas pode vir a ser o normal no final deste século.
As monções anuais do Paquistão trouxeram este ano as piores cheias da história daquele país. Mais a norte, a Rússia vive a mais longa e intensa onda de calor dos últimos mil anos. A intensidade destes fenómenos cíclicos torna este cenário meteorológico muito raro. "A onda de calor [na Rússia] é um alerta", comentou Filipe Duarte Santos, especialista em alterações climáticas da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL).
Pedro Viterbo, coordenador científico do Instituto de Meteorologia, explica que a causa para a onda de calor sentida na Rússia é um forte anticiclone formado sobre aquela região. Este fenómeno "acontece sempre no Verão. O que é anormal nesta situação é a sua intensidade e o facto de se ter formado mais cedo, na Primavera". Num anticiclone, o ar sobe do solo para a atmosfera, causando um tempo seco. As temperaturas elevadas devem-se a correntes de ar vindas dos desertos da Ásia Central, da península Arábica e do Norte de África. Além disso, o anticiclone exerce um efeito de barreira para as chuvas e as tempestades de Verão vindas do Norte, empurrando-as em direcção ao Árctico.
No Paquistão, "a monção extrema pode estar relacionada com o fenómeno El Niño", explicou Pedro Viterbo, referindo-se ao aquecimento das águas superficiais do Pacífico que condiciona o clima em várias regiões do mundo. "As anomalias muito fortes na América do Norte [temperaturas acima do normal] parecem consistentes com o El Niño."
Nem Pedro Viterbo nem Filipe Duarte Santos quiseram estabelecer uma relação causa-efeito entre estes fenómenos extremos e as alterações climáticas. "Não há certezas científicas, mas penso que estes fenómenos são indicações claras das alterações climáticas, tanto mais que se sabe que o aumento da concentração de gases com efeito de estufa na atmosfera causa fenómenos climáticos extremos mais intensos. Há 90 por cento de probabilidades de que aquilo que se está a passar se intensifique nos próximos anos", diz Filipe Duarte Santos.

As anomalias

Pedro Viterbo recordou a onda de calor que atingiu o Sul da Europa em 2003. "Foi uma enorme anomalia, de tal maneira que tem um período de retorno de mais de mil anos, é um evento absolutamente excepcional." Mas isso vai mudar. "Um em cada dois Verões no final do século XXI vai ser igual ao de 2003." O investigador compara a magnitude do fenómeno com o que a Rússia está a viver.
Para Pedro Viterbo, os modelos climáticos não permitem prever catástrofes, mas ajudam a determinar tendências. "Não se vai conseguir prever que o Verão de 2045 seja quente, mas daqui a dez anos talvez se consiga prever que a década de 2040 seja mais quente do que a média." E isto pode ajudar a tomar opções urbanísticas e de construção de infra-estruturas, desde barragens até habitações, opinou.
O mapa mundial das temperaturas para a próxima semana, produzido pelo Centro Europeu de Previsão Meteorológica a Médio Prazo (ECMWF), prevê grandes probabilidades de continuação do tempo quente para a Rússia e a península Ibérica. Os meteorologistas, citados ontem pela agência AFP, dizem que, na Rússia, o calor vai continuar até meados de Agosto ou até mais tarde.
Os primeiros seis meses deste ano foram, segundo os especialistas, os mais quentes do mundo desde que há registos oficiais, meados do século XIX. Em Portugal, o mês de Julho foi o mais quente desde 1931.




Incêndios, cheias e deslizamentos

Paquistão

O Paquistão enfrenta uma catástrofe mais grave do que o tsunami que em 2004 atingiu a Ásia, alertou ontem a ONU, pedindo aos doadores para reforçarem a ajuda ao país.
Os números da tragédia são avassaladores. Quinze milhões de pessoas foram afectadas pelas cheias na bacia do rio Indo, que atravessa o Paquistão de norte a sul. Dois milhões ficaram desalojadas e calcula-se que um milhão continuem isoladas pelas águas ou pelos deslizamentos de terras que impedem o acesso a zonas mais remotas, como o vale de Swat (Centro). E a situação ameaça agravar-se na província de Sindh (Sul), onde as águas ultrapassaram já o nível de risco máximo num dique de protecção.
"O tsunami de 2004 afectou cinco milhões de pessoas e o terramoto no Haiti três milhões", explicou Maurizio Giuliano, porta-voz do gabinete de coordenação de assuntos humanitários da ONU, apesar de o balanço de mortos naquelas duas catástrofes naturais ter sido muito superior.
"Peço a todo o mundo para vir em nosso auxílio", exortou o primeiro-ministro paquistanês, Yusuf Gilani, admitindo que Islamabad não tem como acorrer a tantas necessidades. Os EUA e o Reino Unido desbloquearam dezenas de milhões de dólares em ajuda, mas a AFP garantiu que os grupos de caridade islâmica, suspeitos de ligações extremistas, são mais visíveis no terreno do que o Exército paquistanês.


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Rússia

O número de óbitos duplicou em Moscovo, deixando as morgues à beira da ruptura, anunciou ontem o director dos serviços de saúde da capital, atribuindo a situação à vaga de calor e à bruma que há vários dias envolve a região ocidental da Rússia.
Acusado de esconder a gravidade da situação, Andrei Seltosovski deu ontem uma conferência de imprensa, revelando que "o número diário de mortes aproxima-se das 700", quando em situação normal não vai além das 380. Pela terceira semana consecutiva, as temperaturas na cidade rondam os 40 graus - uma vaga de calor que o chefe dos serviços meteorológicos, Alexander Frolov, garantiu ontem ser "a pior em mais de mil anos".
Ao calor junta-se a poluição provocada pelas centenas de incêndios que consomem floresta e turfa (combustível formado por matérias vegetais), 40 dos quais só na região de Moscovo. Ontem, a concentração de monóxido na cidade era mais do dobro dos níveis máximos recomendados, depois de no sábado ter atingido valores recorde (sete vezes o permitido).
E a situação pode ainda agravar-se, já que há várias instalações militares e nucleares ameaçadas pelas chamas. Entre elas está o centro de tratamento de resíduos nucleares de Maiak, nos Urais (Leste).


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China

Subiu para 337 o número de vítimas do deslizamento de terras que no sábado passado engoliu parte da cidade de Zhouqu, no Noroeste da China, e as autoridades adiantam que há mais de mil pessoas ainda desaparecidas.
Ontem, 4500 soldados, socorristas e médicos foram enviados para a cidade, situada numa zona montanhosa da província de Gansu. Mas um residente contou à BBC que há poucas esperanças de encontrar sobreviventes debaixo da lama que, em algumas zonas, chegou a atingir o quarto andar dos edifícios. Há vários dias que a região era assolada por chuvas torrenciais que arrastaram consigo pedras e detritos para o leito do rio Bailong, que corre num estreito vale a montante da cidade. Bloqueado no seu curso, o rio transbordou na noite de sábado, lançando uma avalancha de água e lama sobre a cidade, onde um terço da população é de etnia tibetana.
O deslizamento agrava o balanço de mortos daquelas que são já consideradas as piores cheias da última década na China. As autoridades admitem mais de duas mil vítimas e avisam que a situação pode piorar com as chuvas previstas para o final desta semana.


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Europa de Leste

Pelo menos 15 pessoas morreram nas cheias rápidas provocadas pelas tempestades que atingiram a Europa Central no fim-de-semana e estão agora a fazer subir o nível de vários rios.
A situação mais grave viveu-se no Sudoeste da Polónia, junto à fronteira com a República Checa, onde há ainda dezenas de casas alagadas, estradas debaixo de água e pelo menos uma ponte destruída. Três polacos morreram e no país vizinho há registo de cinco vítimas causadas pela intempérie, que também assolou o Norte da Lituânia, provocando quatro mortos.
A norte, as preocupações estão centradas no rio Neisse, que corre ao longo da fronteira com a Alemanha. O nível das águas subiu 4,5 metros acima do nível normal junto à cidade de Goerlitz e centenas de pessoas foram evacuadas. Há registo de três mortos.


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Gronelândia

Um Iceberg gigante separou-se de um glaciar na Gronelândia. A massa de gelo tem cerca de 26 quilómetros quadrados. Desde 1962 que o Ártico não perdia uma quantidade semelhante de gelo, suficiente para satisfazer todas as necessidade de água potável da população dos E.U.A durante 120 dias.


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via A.F.P.

Posted by por AMC on 08:11. Filed under , , , . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Feel free to leave a response

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