|

Céus da Amazónia


Há céus que acalmam, céus que mesmo quando se fecham, densos e pesados, abrem ao horizonte. Pensava nisso esta manhã, olhando a limpidez azul que rompeu junto com o dia sobre Lisboa: um céu azul de claridade e, no entanto, tão opressor, tão vago de ameaças suspensas e sem remédio. Abri as janelas de par em par para suavizar essa impressão sufocante de um dia belo de Primavera, amanhecido, todavia, tão sem fôlego, tão sem ar. Como a asfixia não se dissolvesse, tratei de revirar as gavetas e de lá tirar lembranças de outras paragens, como um asmático em pico de crise, revirando os bolsos em busca das bombas que sabe dilatarem-lhe os pulmões o suficiente, para que pelo menos algum oxigénio ralo por eles corra e a pressão que impede o acto banal de respirar se alivie.
Vêm-me à cabeça as exclamações assustadas que tantas vezes escuto em Portugal: há bichos grandes na Floresta, tarântulas, aranhas, piranhas, onças bravas e cobras anacondas. Perigoso morar num lugar assim, tão à mercê de jacarés. Perigoso, isso sim, viver num país como Portugal, tão cheio de gravatas e colarinhos brancos, que decidem ao domingo a melhor maneira de esfolar e engolir vivo à segunda-feira qualquer indivíduo que ouse sair à rua para trabalhar! Perigoso, isso sim, viver numa cidade como Lisboa, onde nenhum tecto nos protege e até a nossa própria casa deixou de ser um lugar a salvo.

Posted by por AMC on 12:27. Filed under , . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Feel free to leave a response

0 comentários for "Céus da Amazónia"

Leave a reply