Até o ex-secretário de Meio Ambiente de São Paulo , José Goldemberg, vê a contradição existente entre protecção ambiental e grandes projectos de desenvolvimento
As dificuldades para conciliar desenvolvimento econômico e proteção ambiental travam as grandes obras de infraestrutura. Casos emblemáticos são a usina hidrelétrica de Belo Monte, o projeto de exploração do pré-sal e portos em São Paulo, Rio e Bahia, além do Rodoanel.
Muitos dos projetos sofreram modificações por causa da pressão para atender às exigências ambientais. Ainda assim, ONGs e o Ministério Público questionam as obras por causa de seus grandes impactos.
Esses embates levaram o governo a preparar um pacote de mudanças para tornar mais célere e menos burocrático os processos de licenciamento ambiental. Áreas como petróleo, rodovias, portos e linhas de transmissão de energia terão normas fixadas por decretos. Para especialistas ouvidos pelo Estado, o choque de gestão é necessário - mas não deve significar um afrouxamento das regras ambientais.
José Goldemberg, ex-secretário de Meio Ambiente de São Paulo, defende que a qualidade do projeto é o mais importante. "A verdade é que há maneiras de fazer as coisas. O trecho sul do Rodoanel ficou 25% mais caro, custou algo em torno de R$ 1 bilhão a mais, por conta das preocupações ambientais. Mas, no fim, foi construído muito bem e se resolveu um problema importante do trânsito", diz.
Em sua opinião, o impasse atual ocorre por que há muito extremismo e maniqueísmo. No caso de Belo Monte, por exemplo, ele avalia que o governo empurra a construção da usina a ferro e fogo, pois assim poderá fazer qualquer obra na Amazônia. Os ambientalistas, por outro lado, querem barrá-la completamente para não abrir precedentes.
Outro problema é que, em geral, nas obras de usinas, os prejudicados estão próximos do local do empreendimento e os beneficiados, a muitos quilômetros de distância. "Cabe ao poder público balancear os prejuízos."
Atraso. Na avaliação do economista Sérgio Besserman Vianna, ex-diretor do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a visão que opõe desenvolvimento e questões ambientais é atrasada. "Esse anacronismo não corresponde mais à realidade. Quem continuar apostando nisso vai errar, pois a economia global está iniciando a maior transição tecnológica desde a Revolução Industrial", diz.
Segundo Besserman, a economia ancorada no desenvolvimento a qualquer custo e nos combustíveis fósseis está no começo do seu declínio, e será substituída por uma economia de baixo carbono e baseada na manutenção dos recursos naturais. "É certo que essa transição ocorrerá, e sairão na frente os países que eliminarem essa visão obsoleta de que ambiente e desenvolvimento não podem conviver."
Outra fórmula para reduzir o embate é investir em tecnologias ambientais de ponta. É o que propõe o ex-secretário adjunto de Meio Ambiente de São Paulo Casemiro Tércio Carvalho. Hoje à frente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, Carvalho está retomando o polêmico projeto de expansão do porto de São Sebastião, no litoral norte de São Paulo. Para os críticos, o empreendimento, que pretende aumentar a capacidade de operação do porto dos atuais 400 mil m² para 1 milhão de m², trará prejuízos ao turismo e à pesca. "Mais do que a expansão, é necessária a modernização do porto. A meta é construir, em quatro anos, um empreendimento com gestão ambiental e certificações internacionais de sustentabilidade para portos, como o selo Greenport."
Gargalos. Para o procurador-chefe do Ministério Público Federal no Pará, Ubiratan Cazetta, os verdadeiros nós enfrentados na hora de emitir um licenciamento não têm sido observados. "Ultimamente, muitos servidores do Ibama são terceirizados, têm contratos temporários. Esse é o nosso grande gargalo: a quantidade de servidores do Ibama a cargo das fiscalizações, sua qualificação técnica e independência - o que só se consegue com um plano de carreira e certa estabilidade", afirma.
publicado em O Estado de S. Paulo e Diário do Grande ABC
E a propósito disto.