Porque não, não «parece mal falar de desemprego no dia do trabalhador»
por Fernanda Câncio
Não sendo economista nem tendo especial queda para os números, tenho pejo em falar de questões com eles relacionados. Mas, precisamente por isso, gosto que quem fala fundamente o que propõe ou decide. Assim, quando vejo o primeiro-ministro e o líder do principal partido da oposição, depois de reunidos para discutir a situação difícil do País e, presumo, formas de dela sair, perfilarem-se para anunciar a aplicação imediata do PEC mencionando com especial ênfase a alteração das regras do subsídio de desemprego, espero que me digam, de imediato, em que é que isso diminui o défice ou contribui para alterar a situação da dívida externa.
Espero ainda - ou melhor, exijo - que me façam perceber por que raio, no universo das medidas do PEC, o destaque na reacção de Portugal à avaliação desfavorável de uma empresa de rating consiste no anúncio da diminuição dos montantes do subsídio de desemprego - alegando que com isso se pretende certificar que ninguém ganhe mais com o subsídio que o que ganhava com o salário - e da obrigatoriedade imposta aos seus beneficiários de que aceitem empregos com salário 10% superior ao valor de subsídio auferido. E exijo-o tanto mais quanto as regras existentes desde 2006 para atribuição e manutenção do subsídio de desemprego não só estabelecem como montante máximo para o mesmo três salários mínimos, pagos 12 meses/ano - ou seja, qualquer que tenha sido o valor do salário auferido e das decorrentes prestações para a Segurança Social, o desempregado só pode receber até cerca de 1500 euros/mês -, como já é interdito existir um subsídio de desemprego superior ao valor líquido da remuneração de referência (número 3 do 29.º artigo da lei 220/2006). Aliás, o subsídio de desemprego é sempre 65% da remuneração de referência, calculada a partir do total de remunerações registadas no ano que antecede o desemprego. E os beneficiários do subsídio são já obrigados a, além de fazerem prova documental de "procurar activamente trabalho" e de se apresentarem quinzenalmente no centro de emprego (qualquer incumprimento tem de ser justificado com um mês de antecedência), aceitar um emprego que lhes garanta um salário ilíquido 25% superior ao subsídio de desemprego (se a oferta ocorrer durante os primeiros seis meses da prestação do subsídio) ou 10% (a partir do sétimo mês). São até, pasme-se, obrigados a aceitar "trabalho socialmente necessário".
Temos pois, parece, uma lei já suficientemente draconiana - tanto que é difícil distinguir o proposto do que está em vigor. De modo que, e volto a perguntar, que foi mesmo este anúncio e serviu para quê?
em adenda:


