Começou o forró: está aberto o período autorizado para a caça aos desempregados!
Um vídeo oportunamente flagrado pela TV Arrastão, exemplar daquilo a que o Daniel muito bem faz reparo aqui:
Em defesa do PEC, os spin doctors do governo exploram o ódio social a desempregados e a quem recebe o rendimento mínimo, mostrando com orgulho o que cortaram e fazendo passar a ideia que os “mandriões” estão a pagar a crise. A direita populista pode aplaudir, satisfeita com o estilo.
Alguém explique, por favor, ao economista-comentador Peres Metelo que os desempregados foram os primeiros chamados a pagar a crise. É certo que agora não convém e já ninguém gosta de se lembrar disso, mas foi um preço bastante alto, esse que pagaram: custou-lhes o emprego. Alguém lhe explique que o fundo de desemprego, mesmo quando se tem direito a ele, representa apenas 65% do ordenado declarado pela entidade patronal à data do despedimento. Ninguém é mandado para casa a receber o mesmo ao fim do mês (bem pelo contrário!), como o economista-comentador insinua ao dizer que «trabalhar e ter esse esforço não pode ser o mesmo do que ter um apoio da sociedade sem nenhum esforço, sem nenhuma contra-partida».
Quanto às contra-partidas a dar por quem recebe subsídio de desemprego, só apetece perguntar se enlouqueceram ou se estão simplesmente a querer gozar com aqueles que a crise atirou para a pior situação de fragilidade social que se poderia desejar, precisamente quando se anunciavam tempos negros sem fim à vista. A contra-partida já os desempregados a deram, ou já ninguém se lembra? Deram-nas enquanto tiveram emprego, durante todos os anos em que trabalharam e descontaram mensalmente para a Segurança Social.
Ouvindo Peres-Metelo defender que «se a sociedade solidariamente minimiza o risco do desemprego para que as pessoas não caiam na miséria total e na fome, é justo que haja uma contra-partida» fica-se quase com a certeza de que é um favor, tão magnânimo quanto inglório, esse que tem para com os preguiçosos que tiveram a casualidade de serem despedidos. Alguém recorde a Peres Metelo que não é uma esmola: é um direito dos cidadãos. Existe enquanto, isso sim, obrigação do Estado Social para o qual cada um de nós contribui com parte do que ganha ao final de cada mês, porque nos foi dito que todos em conjunto devemos colaborar com a nossa parte para prestar apoio aos que dele mais necessitam.
Se agora a sociedade "paga" a cada desempregado é só e somente porque antes disso pagou à sociedade. É essa, aliás, a razão argumentada para que quem nunca descontou para a Segurança Social não tenha direito a subsídio de desemprego e não receba um tostão.
Por ordem de raciocínio idêntica não deve faltar muito a que se comecem a pedir contra-partidas às grávidas pelos subsídios de maternidade «que recebem da sociedade», aos idosos pelos complementos de reforma, aos pais pelos abonos de família, aos doentes pela comparticipação nos medicamentos, pelas baixas médicas, assistência nacional na saúde, etc, etc, etc.
Sempre gostava de saber para quando igual exigência de contra-partidas e fiscalização à banca, que o Governo tão prontamente apoiou com uns milhões dos contribuintes (a tal «sociedade», portanto), em nome dos portugueses que a ela trazem confiados empréstimos e poupanças, e que ao invés aumentam juros, dificultam créditos e especulam taxas, para já não falar nos que se põem a salvo com as dores de cabeça remediadas e lhes ficam com o dinheiro, que sendo casos de polícia se dá a benesse de deixar para os tribunais. Para quando (se é que alguém pensa nisso) a exigência de contra-partidas e fiscalização às empresas a quem o Governo subsidiou em nome da viabilização económica ou em troca da manutenção dos postos de trabalho e que, na maioria dos casos, ou fecharam ou continuaram a despedir, sem ninguém lhes pedir contas do destino que deram às verbas recebidas.
«Há uma enorme tentação para se fazer demagogia com estas coisas», suspira a dada altura Peres Metelo.
Depois de o ouvir falar, só apetece perguntar: ... a sério??
