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MPF entra na Justiça com recurso em favor de índios no caso Belo Monte

protesto dos povos indígenas do Xingu, Altamira, Junho de 2007
foto: CIMI Norte II
O MPF (Ministério Público Federal) entrou com recurso contra a decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) que declarou legal o decreto legislativo que autorizou a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA), sem consulta prévia aos povos indígenas da região.
No julgamento, em Novembro de 2011, a tese do MPF no Pará de que as oitivas indígenas deveriam ter sido feitas antes da autorização do Congresso Nacional para construir a usina, foi vencida por 2 votos a 1.
Na acção, proposta em 2006, os procuradores do MPF argumentaram que o direito à consulta é garantido aos povos indígenas pela Constituição Federal e também está previsto na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), ratificada pelo Brasil em 2003.
Os argumentos foram acolhidos pela relatora do processo no tribunal, desembargadora Selene Almeida, mas contestados pelos desembargadores Fagundes de Deus e Maria do Carmo Cardoso. Segundo eles, a lei não determina que a consulta aos indígenas seja feita necessariamente antes da autorização do Congresso Nacional.
No recurso apresentado hoje, o MPF disse que o voto do desembargador Fagundes de Deus – tese vencedora do julgamento - “não se manifestou especificamente sobre as normas da Convenção 169 da OIT, enquanto o voto da relatora [desembargadora Selene Almeida, vencida] analisou a incidência de diversas normas da convenção”, diz o recurso, assinado pelo procurador regional da República da 1° Região, Odim Brandão Ferreira.

O novo requerimento evoca agora o facto da Convenção 169 da OIT impor aos governos "consultar os povos interessados, a fim de determinar se os interesses desses povos seriam prejudicados, e em que medida, antes de empreender ou autorizar qualquer programa de prospecção ou exploração dos recursos existentes nas suas terras”, para em seguida concluir: “portanto, a tese da consulta às populações indígenas em momento antecedente ao da autorização do uso de recursos das terras por eles ocupadas é letra expressa do pacto internacional firmado por esta República”. Outra questão apontada no recurso é a de que a Convenção 169 – transformada em lei no Brasil por meio do Decreto Legislativo 143/2002 – também prevê a protecção, a integridade cultural, social e económica e garante o direito democrático de participação nas decisões que afectam directamente esses povos. “De nada adiantaria garantir-lhes a posse de terra, quando seus recursos naturais – sobretudo a água que os banha – são vilipendiados”, argumenta o procurador Odim Ferreira.

O recurso já está no Tribunal Regional Federal da 1ª Região em Brasília e deve ser apreciado pela 5ª Turma (a mesma que derrubou a acção do MPF).
# Nº do processo para acompanhamento: 000709-88.2006.4.01.3903
# Íntegra do Recurso: AQUI.
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NOTA: Desta vez a notícia reverberou em Portugal: chegou à Agência Lusa e foi publicada no jornal Sol: "Justiça brasileira questiona falta de consulta a indígenas antes da construção de hidroeléctrica".

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Sobre o projecto

A Usina de Belo Monte terá capacidade plena de 11 mil MW por ano e vai operar em média com 4,5 mil MW.  A obra já rendeu 13 ações de contrárias do Ministério Público, entre elas uma que questiona a constitucionalidade do processo que autorizou a obra.
O Congresso Nacional, em julho de 2005, autorizou o Executivo a fazer “o aproveitamento hidroelétrico” de Belo Monte, mas sem ouvir as comunidades indígenas afetadas, como prevê o Artigo 231 da Constituição Federal.
A EPE colocou sob consulta pública o Plano Decenal de Expansão de Energia até o próximo dia 30. O documento fundamentará a elaboração de projetos futuros em diversas modalidades de produção de energia em todo o país, inclusive energia hidrelétrica na Amazônia.
Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), ligada ao Ministério das Minas e Energia, o Brasil faz uso de fontes alternativas de energia. De 2004 a 2010, foram contratados cerca de 10 mil megawatts (MW) de energia solar, eólica e de biomassa.

Depoimento de Marina Silva para o Movimento Gota d'Água:


OIT diz que governo violou Convenção 169 no caso de Belo Monte

Um relatório da Comissão de Especialistas em Aplicação de Convenções e Recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT), divulgado no último sábado, 3, confirma que o governo brasileiro deveria ter realizado as oitivas indígenas nas aldeias impactadas por Belo Monte antes de qualquer intervenção que possa afetar seus bens e seus direitos. A nota técnica da OIT corrobora a posição do Ministério Público Federal (MPF) e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que já interpelaram o governo brasileiro sobre a não realização das oitivas.
De acordo com o documento da OIT, “a Comissão lembra que, em virtude do artigo 15 da Convenção, o governo está obrigado a consultar os povos indígenas antes de empreender ou autorizar qualquer programa de exploração dos recursos existentes em suas terras”, afirmando que Belo Monte poderá alterar a navegabilidade do Xingu, bem como a fauna, a flora e o clima da região. Estes impactos, afirma a OIT, “vão mais além da inundação das terras ou dos deslocamentos dos referidos povos”.
A não realização das oitivas, previstas também na Constituição Federal, motivou uma ação civil pública do MPF que, indeferida no Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF1) no final de 2011, deve seguir, após recurso, para votação no Supremo Tribunal Federal.
Agora, com a manifestação da OIT, os argumentos de parte dos desembargadores do TRF1 – de que a oitiva pode ocorrer em qualquer momento do processo -, são definitivamente invalidados. O documento também derruba argumentos de funcionários do governo de que os indígenas teriam sido ouvidos, mesmo que em reuniões informais. “Não se pode considerar que uma simples reunião informativa cumpra com as disposições da Convenção”. E conclui: “a Comissão [técnica] avalia que, de acordo com a documentação e as informações apresentadas pelo governo, os procedimentos levados a cabo até agora, mesmo que amplos, não reúnem os requisitos estabelecidos nos artigos 6 e 15 da Convenção, e tampouco demonstram que foi permitido aos povos indígenas participar de maneira efetiva na determinação de suas prioridades, em conformidade com o artigo 7 da Convenção”.

Nas recomendações finais, a Comissão de Especialistas pede ao governo brasileiro que:

  1. Tome as medidas necessárias para levar a cabo consultas com os povos indígenas afetados, em conformidade com os artigos 6 e 15 da Convenção, sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte, antes que os possíveis efeitos nocivos da dita usina sejam irreversíveis;
  2. Em consulta com os povos indígenas, tome medidas para determinar se as prioridades dos ditos povos foram respeitadas e se seus interesses serão prejudicados, e em que medida, afim de adotar as ações de mitigação e indenização apropriadas;
  3. Informar a Justiça Federal do Pará sobre os resultados do procedimento.

O que é a Convenção 169 da OIT

A Convenção sobre Povos Indígenas e Tribais - Convenção 169 – foi ratificada pelo país em 2002 e promulgada, via decreto presidencial, em 2004. A Convenção 169 estabelece, entre outros, que os povos indígenas e tribais têm o direito de serem consultados de forma livre, prévia e informada sobre ações do Estado que possam afetar seus bens ou direitos.

# Para ler o documento completo (inclui ainda outros projectos federais com falhas no cumprimento da Convenção 169): AQUI.

via Xingu Vivo (05/03/2012)

Cf. também:


Mais informações:
Usar a caixa de pesquisa na coluna da direita do blog ou consultar o arquivo do Conexão para "Belo Monte"

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