"Presidente da República pede cuidado no relacionamento político com Angola"
Leio no Diário de Notícias:
"Temos de ser muito cuidadosos com o nosso relacionamento político com Angola", advertiu ontem o Presidente da República, sublinhando que é preciso "nunca deixar dúvidas de que respeitamos Angola, os seus dirigentes e as opções do povo angolano".
Numa conferência de imprensa que deu ontem ao final da tarde no Lobito, já em jeito de balanço da visita oficial, Cavaco Silva defendeu que as relações com o país de José Eduardo dos Santos devem ser "inteligentes", porque "Angola é um mercado em expansão que pode ser aproveitado de forma crescente pelos empresários portugueses".
No saldo da viagem, o Chefe do Estado já leva uma vitória: um passo em frente na resolução das dívidas pendentes. Por isso, mostra-se satisfeito quando reencontra aqui alguns dos empresários que se queixaram, numa audiência com o Presidente antes da visita, desta situação: "Encontrei alguns empresários portugueses com um sorriso bem diferente daquele que tinha detectado no Palácio de Belém."
Cavaco confirmou que "já foram assinados vários acordos" para a liquidação da dívida e adiantou que "as autoridades [angolanas] querem que até ao final desta semana ocorram reuniões com todos os empresários das grandes empresas". O que está previsto é que o pagamento seja feito numa tranche inicial correspondente a 40% da dívida e as restantes tranches de forma faseada. Quanto às pequenas e médias empresas, Eduardo dos Santos adiantou que os credores receberão o dinheiro num prazo de dois meses.
O Chefe do Estado elogiou as declarações públicas do Presidente angolano, considerando que o momento "foi muito importante para repor um clima de confiança".
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A semana foi, é um facto, marcada por imagens e notícias do sucesso apoteótico da visita oficial de Cavaco Silva a Angola. À laia de balanço final, ainda no Lobito, o presidente português diz-se «feliz» por ter desbloqueado problemas às empresas portuguesas em Luanda e pede «respeito por Angola».
E fico eu a perguntar-me como devemos interpretar esta dupla mensagem que Cavaco Silva não se tem cansado de repetir. Quererá isso dizer que, para «nunca deixar dúvidas de que respeitamos Angola, os seus dirigentes e as opções do povo angolano», a partir de agora devemos tapar os olhos e fazer ouvidos moucos a evidências como esta?
Recomenda Cavaco Silva que sejamos «inteligentes» porque «Angola é um mercado em expansão que pode ser aproveitado de forma crescente pelos empresários portugueses». Ao mesmo tempo, lembra que durante a visita oficial «já foram assinados vários acordos» para liquidar as dívida de Angola às empresas portuguesas.
Sabe-se, na verdade, que só no sector da construção civil este montante ascendida, em Abril, aos 2, 5 mil milhões de dólares. Uma facada considerável, sobretudo no contexto da grave crise financeira que se vive em Portugal. Para maior tranquilidade das hostes, Cavaco Silva tratou de fornecer algum detalhe e até descreveu as tranches envolvidas no pagamento. Aquilo que pulou no discurso e se esqueceu sempre de explicar foi de onde virá o dinheiro com que se acordou, então, proceder à amortização desta dívida. Um lapso sério porque se reveste da maior importância para avaliar correctamente o êxito da visita a Angola e os frutos que ela terá produzido. É que, na sua ignorância, pode muito bem ser que a economia nacional tenha começado a lançar foguetes antes do tempo e que, bem vistas as coisas, a alegria seja vã. Especialmente se o compromisso angolano com o pagamento implicar ao já magro cofre do Estado português accionar esta outra promessa acordada, em 2009, pelos dois países. Neste caso – mais que não seja por respeito à crise que traz Portugal com a corda no pescoço e os portugueses de cinto apertado – dava jeito perceber de que bolso vai exactamente sair o dinheiro para saldar a dívida: se das contas de Angola, se dos cofres do Estado português. Dito de outra maneira, dava jeito saber se, afinal de contas, quem vai ajudar as empresas portuguesas é mesmo Angola ou Portugal em sua vez
Mas isso, claro, em tempo de balanço aos media não interessa nada. Fica para depois. Logo se vê. Isso, como facilmente se suspeita, 'são outros 500''.
