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"O choque"

por Viriato Soromenho Marques

Como se chamará uma civilização que não aprende com o que a sua ciência lhe ensina e que esquece as lições dos seus próprios erros? Certamente que o nome mais adequado será o de "civilização contemporânea". Lembro-me como se tivesse sido ontem. Em outubro de 1973, corríamos a ler os jornais que traziam as notícias das batalhas do deserto, na Guerra do Yom Kippur, e, ao mesmo tempo, a informação da subida política, brutal e exponencial, do preço do petróleo. Reunida em Viena, a OPEP não perdoava o apoio dos EUA, da Holanda e de Portugal, a Israel, na sua luta contra a ofensiva unida dos Estados árabes vizinhos. Todo o mundo sofreria duma subida de 400% do barril de crude, e das perturbações no circuito comercial. Na Dinamarca passou-se um inverno gelado, como em 1944. Mais tarde ficámos a saber duas coisas fundamentais: a) que o petróleo tinha um fim anunciado, e que a sua escassez o tornaria cada vez mais caro; b) que o seu uso como combustível estava a mudar a estrutura química da atmosfera, ameaçando o planeta de alterações climáticas que poderiam ser fatais para a própria sobrevivência da humanidade. Foram quase 4 décadas de "tomada de consciência", mas sobretudo de retórica. Hoje, novas potenciais guerras espreitam no horizonte. Medos estratégicos aliam-se a custos crescentes da extração, e a uma procura insaciável, fazendo escalar os preços de um combustível que continua a ser o sangue vital da economia mundial. Somos uma civilização viciada em combustíveis fósseis. Os poucos esforços para romper com esta lógica de marcha para o abismo são ridicularizados e deturpados, como se vê no bizarro debate sobre energia em Portugal. Preocupados com a dose seguinte, esquecemo-nos que o futuro se deveria medir no tempo das gerações seguintes.

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