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Deputado do CDS aconselha funcionários públicos insatisfeitos a saírem do Estado

Leio no Diário Económico:

"Se as pessoas [funcionários públicos] não estiverem disponíveis têm sempre como alternativa a hipótese de negociarem a sua situação contratual", afirmou hoje o deputado democrata-cristão à TSF comentando a proposta do Governo para agilizar a mobilidade na função pública, de forma a transferir trabalhadores de serviços onde há excesso de pessoal para outros com falta de recursos humanos. João Almeida acrescentou que esta mobilidade é normal no sector privado e noutros países. "São regras normais" pelo que a alternativa para as pessoas indisponíveis para mudar é "negociar a sua situação contratual", afirmou.
A proposta do Governo, enviada ontem para os sindicatos, prevê a criação de um regime de mobilidade geográfica que permita a transferência de funcionários públicos, sem o seu acordo, para concelhos fora da sua área de residência. 

Lido já soa mal, mas visto (ao vivo e a cores) na televisão ainda consegue ser pior (aqui). O ar displicente, o esgar de desprezo pendurado no fio do lábio, os tiques de sobranceria a penderem juntamente com a melena da testa.
Quem é este rapaz?! Quem pensa ele que é?! É certo que o partido era curto de deputados e que com a debandada geral para as pastas ministeriais, que a coligação no Governo proporcionou, lhe sobrou mais espaço na bancada, mas não se lhe conhece nem trabalho de mérito, nem curriculum de peso para subir nos bicos dos pés, inchar o peito e cantar de galo com esta proa. Tal como ele, também nós não queremos pagar a funcionários públicos «para não fazerem nada». Se «não são precisos», sinto lembrar, foi o Estado que os contratou. Quando o fez atribuiu-lhes um local de trabalho, que seguramente ponderaram antes de aceitar. Mas são gente e, caso não ocorra, o mais provável é terem vida e família depois da hora do expediente. Não pode agora vir o Estado, obviamente já esquecido do detalhe, decidir – à sua revelia – deslocá-los para onde muito bem entender.
A prepotência deste tipo de postura é perigosa porque contribui amplamente para agravar os impactos sociais da própria crise económica (como se estes já fossem sendo poucos!). Desestrutura-se a vida pessoal, desagrega-se a coesão familiar e depois pede-se que a natalidade cresça para contrariar o envelhecimento acelerado da população. Como?! E se existirem filhos? Alguém se interrogou sobre as consequências de os privar de um contacto diário com o pai, ou a mãe, ou os dois ao mesmo tempo? Quem se ocupará das crianças? E se tiverem que mudar de escola, cortar com o meio, abandonar os amigos? Alguém se perguntou sobre o feito de as desenraizar de repente do meio onde cresciam e as obrigar a novo processo de adaptação? E se existirem idosos ou doentes a cargo destas pessoas? Quem se irá ocupar deles, se as reformas são curtas, a rede social de apoio magra e as reformas e subsídios pequenos e sujeitos a cortes e mais cortes? Com os impostos sobre os bens essenciais a fazerem disparar o preço da cesta básica, a factura da electricidade, os combustíveis e os transportes a sofrerem aumentos atrozes, com as famílias endividadas até ao pescoço, incapazes de pagar a casa ou a renda, com os bancos a recusarem crédito de qualquer espécie, será viável acreditar que existam condições de duplicar as contas destes agregados e pedir-lhes que passem a sustentar os custos de duas vidas em dois locais geograficamente distintos? Alguém se perguntou um terço disto? É porque se acaso o fez, responder que quem não aceitar ser deslocado pode deixar o Estado é a mesma coisa que forçá-lo a um despedimento, na grande maioria dos casos, inevitável.

[ACTUALIZADO]

O que está em causa é a possibilidade de obrigar estas pessoas a aceitarem trabalhar a muitos quilómetros de casa sem nenhum suporte ou contra-partida que não seja a de conservarem o próprio emprego.
Não menos ridículo, portanto, é ouvir Santana Lopes (ainda que num tom mais moderado) dizer que não lhe parece mal, tendo a audácia de se oferecer como exemplo, lembrando para tal que quando foi presidente de Câmara também teve que se mudar para a Figueira da Foz. Esquece o essencial: ninguém o empurrou para lá sem o consultar, candidatou-se ao lugar porque quis. Com todas as facilidades colocadas à disposição do cargo, aliás, e que seguramente lhe permitiam levar a família consigo, lhe garantiam carro e motorista e custeavam despesas de deslocação, caso preferisse vir vê-la ao fim-de-semana. Não consta que o Estado tencione oferecer o mesmo tipo de regalias aos funcionários que vier a deslocar para os compensar dos constrangimentos da mobilidade.

Com a devida vénia ao Paulo Guinote, que tratou do track ao episódio, aqui ficam alguns exemplos do livre curso de "João Rescisões Almeida Pela Blogosfera":

Posted by por AMC on 17:08. Filed under , , , . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Feel free to leave a response

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