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E se o Pingo Doce repetir a campanha num dia de eleições?


Ainda se ouvem, em Portugal, vozes que rejubilam, troçam e ironizam com os milhares de portugueses que a promoção de um supermercado desviou das manifestações do 1º de Maio.
Com a satisfação ao rubro, têm-se servido do fenómeno para fazer prova da justeza de alguns pressupostos e afirmar a validade de outros tantos raciocínios. Se as pessoas preferem uma promoção de supermercado à celebração da data – alegam – é porque esta já não as mobiliza o suficiente. Se não as mobiliza – prosseguem – é porque perdeu significado. Se perdeu significado – concluem –, o melhor é acabar com o feriado que lhe está associado e que se destina a celebrá-la.
As mesmas vozes sucedem-se em adjectivos para elogiar a iniciativa do supermercado: as pessoas ficaram radiantes porque lucraram com a campanha, donde nenhum mal veio ao mundo. Consideram ridículas as preocupações com valores e princípios que possam ter sido comprometidos pela iniciativa e um exagero digno de escárnio que a democracia tenha saído ferida na hora do balanço final.
O jubilo e o raciocínio têm tanto de primário como de perigoso.
A crise está para durar e a situação de carência das pessoas tende, não apenas a agravar-se, como a alastrar. A concorrência de mercado há muito que veio para ficar e as armas do marketing estão aí para usar e aperfeiçoar. A campanha, já se disse, foi um sucesso e é para voltar a repetir. Interessa à empresa que, como se viu, por menos vende mais. Pedem-no os clientes que, como se ouviu, compram mais por menos.
Desta vez, o supermercado escolheu o Dia do Trabalhador. Pode ser que, para a próxima, se decida medir forças e popularidade com outra data que venha menos a calhar.
E se a data escolhida para a segunda campanha vier a coincidir em cheio com um dia de eleições? 
É um exercício de suposição interessante a fazer. A contraposição do apelo irresistível que os 50% de desconto representou para os portugueses aos números da abstenção dos últimos actos eleitorais ajuda a antever para que lado a balança, provavelmente, virá a pender. 
Na Terça-feira, entre manifestarem-se ou irem às compras, os portugueses escolheram ir às compras. E se, um destes dias, voltarem a escolher fazer o mesmo em vez de irem votar?
Estarão as vozes que agora rejubilam em condições de sustentar o mesmo raciocínio?

Posted by por AMC on 16:44. Filed under , , , , . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Feel free to leave a response

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