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Dilma reúne pela 1ª vez com o Fórum Brasileiro de Mudanças Climática

A presidente Dilma Rousseff (ao centro) em reunião ordinária do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, no Palácio do Planalto; da esq. para a dir., os ministros Marco Antonio Raupp (Ciência e Tecnologia), Gleisi Hoffmann (Casa Civil); o secretário executivo do fórum, Luiz Pinguelli Rosa; e os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Antonio Patriota (Relações Exteriores). foto de José Cruz

Com um discurso desenvolvimentista e críticas declaradas às energias alternativas, a presidente Dilma Rousseff declarou ontem, em Brasília, que não há espaço para discutir "fantasia" na Conferência de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, Rio+20. A afirmação marcou a primeira reunião do Fórum Brasileiro de Mudanças Climática convocada durante o seu mandato, no Palácio do Planalto, e foi amplamente veículada pela mídia.
Dilma demonstrou preocupação em organizar o discurso em torno de dois grandes eixos: a imperiosa afirmação do Brasil na liderança da Rio+20 e a defesa incondicional da aposta nas hidrelétricas, em detrimento de qualquer outra alternativa.

Novo paradigma de crescimento

A presidente insistiu na ideia de que o Brasil precisa assumir um papel pioneiro no comando da Conferência e sugerir ao Mundo um novo "paradigma de crescimento". Na sequência, afirmou que o debate sobre geração de energia tem, todavia, que ser científico e que os países devem demonstrar uma visão ampla, evitando apresentar propostas "olhando para o seu próprio umbigo".
"Encontrar um caminho comum é um processo difícil. Desta vez, eu acho que temos uma missão [na Conferência] até mais difícil, que é propor um novo paradigma de crescimento que não pareça fantasioso. Porque ninguém numa Conferência dessas aceita, me desculpem, discutir fantasia. Ela não tem espaço, a fantasia. Eu não falo da utopia, falo da fantasia. Eu tenho de explicar às pessoas como elas vão comer, como terão acesso a água e energia". E completou: "Eu não posso dizer para elas que só com eólica é possível iluminar o planeta. Não é. Só com solar?  De maneira nenhuma. Para garantir energia de base renovável que não seja hídrica, fica difícil, né? Porque eólica não segura, né? E todo mundo sabe disso."

Prioridade às hidrelétricas e crítica às alternativas

Dilma deixou claro que prioriza a produção de energia hidrelétrica, sustentando que não se pode acreditar que o desenvolvimento ocorrerá apenas com energias eólica e solar. Contou que certa vez foi a Espanha, país geralmente citado como referência no aproveitamento da energia eólica, e constatou que há oito meses que as pás de vento não funcionavam porque "não havia vento".
A presidente evocou depois a época em que era secretária de Energia, Minas e Comunicações do Rio Grande do Sul para mostrar que sabe do que fala. "Eu, quando comecei a mexer com esse negócio de energia, cheguei a medir vento.  Isso foi no Rio Grande do Sul", começou por dizer, para em seguida ironizar: "Não tem como estocar vento, não tem como. [...] Não sei se vocês sabem, mas não venta 24 horas por dia nem 365 dias por ano. Eu estou falando isso porque eu já medi vento em Porto Alegre", afirmou.
Apesar de reconhecer que faltam reservatórios nas hidrelétricas brasileiras, Dilma continuou a defender que a energia eólica deve servir como uma espécie de reservatório alternativo para a energia de fonte hidráulica, funcionando como forma de compensação em situações de escassez de chuvas. Até porque "reservatório de água a gente faz.  Mas não faz reservatório de vento", disse sem esconder as suas renitências. "Deus nos ouça, que a eólica consiga ser reservatório de hidrelétrica no Brasil. Deus nos ouça. Nós vamos ter que suar a camiseta tecnicamente", acrescentou ainda assim.

Discutir o clima na óptica das populações

Depois de um ano e quatro meses sem se reunir com o Fórum e sem priorizar o combate à mudança climática, Dilma chegou decidida a afagar o grupo descontente.
Como que para minimizar a ausência de trabalhos preparatórios anteriores, foi tranquilizando as preocupações gerais e garantindo que não há como não discutir clima na Conferência de Junho. Recorde-se que essa era, aliás, uma das principais críticas que vinha sendo feita pelo secretário-executivo do Fórum, Luiz Pinguelli Rosa, que por várias vezes manifestou apreensão pela ausência de uma agenda mais vincada sobre o tema na Rio+20. Não obstante, a presidente não deixou de lembrar que: "o clima toca em outros aspectos aos quais o Governo dá prioridade, como a pobreza", disse.
Para Dilma, na Rio+20 todos os temas vão se encontrar: "Mudança de clima, biodiversidade, redução da pobreza, direito a energia, melhores condições de vida.  Enfim, como é o futuro do mundo, é isso que vamos discutir na Rio+20.  É um ponto de partida, mais que ponto de chegada.  Desta vez temos de mudar o patamar da discussão.  Nós acumulamos muitas coisas, acumulamos em todas as conferências do clima, em todas as discussões sobre florestas, água.  Agora vamos ter de discutir isso na ótica das populações, dos governos, das comunidades científicas, dos organismos da sociedade civil, organizados ou não."
Secundada pela ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente), a presidente sustentou ainda que tenciona acelerar os programas sectoriais, especialmente os que se referem a cortes de emissões na indústria, que se encontram atrasados.

Alertas e avisos da ala ambientalista

Dilma não escapou da sessão sem, contudo, ver cobrado o veto presidencial ao texto da reforma do Código Florestal. A exigência chegou pela voz da representante do sector ambientalista no Fórum, Sílvia Alcântara, que não calou a condenação aos retrocessos na área ambiental durante o Governo Dilma, acusando-o inclusivamente de, com o pré-sal, elevar o Brasil ao terceiro lugar entre os países que mais emitem gases de efeito estufa já em 2020.
"Às vésperas da Rio+20, grande parte das conquistas da sociedade brasileira na área socioambiental desde a Constituição de 1988, pode ser perdida, e isso seguramente será amplamente denunciado na Cúpula dos Povos", fez, Silvia, questão de avisar a presidente.
Num pequeno pedaço de papel, Dilma foi anotando tudo o que a ambientalista falou. Embora sem nunca se referir directamente às observações de Silvia Alcântara, o facto é que quando tomou a palavra Dilma lançou mão ao trunfo maior do seu programa de Governo, a saber, a luta contra a pobreza, para contrapor as exigências de desenvolvimento e melhoria das condições de vida das populações às reivindicações ambientais, para em seguida as desacreditar, apelidando-as de "fantasias" que pouco ou nenhum eco colheram no Mundo.  Daí, também, o tempo que Dilma ocupou no ataque cerrado que às energias caras às propostas alternativas dos ambientalistas, ao longo da sua intervenção.

[ACTUALIZAÇÃO]

Para ver na íntegra:

Colectiva de ministros:

Apresentação dos resultados do Fórum pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, o ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, e o professor Luiz Pinguelli Rosa, da Secretaria do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas.

Posted by por AMC on 23:08. Filed under , , , , . You can follow any responses to this entry through the RSS 2.0. Feel free to leave a response

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