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"Tormenta financeira sobre Portugal. E a Europa?"

por Gilles Lapouge

 
Como os tsunamis e os tremores de terra, as crises econômicas são seguidas por réplicas. É assim que podemos considerar a nova tempestade que obriga Portugal, cujas finanças já estavam em petição de miséria, a pedir, para evitar o pior, uma ajuda à União Europeia, e uma ajuda pesada: 75 bilhões.
Um terço dessa soma seria fornecido pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) e dois terços pela Europa, e à toda pressa porque Portugal arde. É preciso apagar o incêndio antes de 5 de junho.
Segundo a teoria das réplicas, é preciso olhar ao mesmo tempo para antes e depois da tragédia portuguesa.
Antes, o que se vê? A crise mundial, seguida na última primavera pelo naufrágio das economias alquebradas do euro. Grécia e Irlanda, que foram salvas com choro e ranger de dentes pela Europa com a ajuda relutante da rica Alemanha e da austera senhora Angela Merkel.
Depois, o quadro é negro. Dois países se sentem ameaçados após Portugal. O primeiro é a Grécia, que a despeito de um plano feroz de austeridade não consegue reequilibrar suas contas. O déficit orçamentário grego não será de 9,4% do Produto Interno Bruto (PIB) conforme o prometido, mas de mais de 10%. Em 2011, a dívida ultrapassará 150% do PIB. Resultado: Atenas só encontra compradores para sua dívida, neste momento, oferecendo juros de 15% para empréstimos de dois anos.
Segundo temor: a Espanha provoca calafrios. Suas contas não estão tão descontroladas como as de Lisboa, mas sua economia vacila. De mais a mais, desponta no horizonte uma crise política que poderá tirar do poder o primeiro-ministro José Luis Rodríguez Zapatero e, talvez , os socialistas. Portanto, a bancarrota de Portugal pode precipitar a derrocada da Espanha.
Os especuladores que giram em torno dos "corpos doentes" como urubus, agora que acertaram suas contas com Portugal, vão secar seus bicos, se regalar e procurar outras presas. Se atacarem a Espanha, toda a Europa estremecerá porque o salvamento de uma economia tão poderosa estaria, certamente, fora das possibilidades do Velho Continente. A Espanha, dizem os banqueiros, e depois quem? A Itália? A França? Seria o fim do euro, da moeda comum.
Na manobra, de um lado estão os Estados e as instituições internacionais, do outro, os especuladores. E as agências de classificação? Estas são detestadas. Ao atribuírem notas aos diferentes países, elas fomentam desordens, cavam abismos e inflamam especulações.
As taxas às quais os Estados tomarão emprestado são na verdade ditadas pelas notas que as três agências de classificação de risco (Moody"s , Standard & Poor"s e Fitch, todas americanas) distribuem. Exemplo: a classificação de Portugal acaba de ser rebaixada. Resultado: os juros de refinanciamento da dívida portuguesa nos mercados atingiram 8,8%.
Insustentável. Mesmo percurso para a Grécia: em março, o país foi rebaixado pela agência Moody"s pela nona vez em 404 dias. No fim de março, a agência Standard&Poor"s fazia o mesmo. Como explicar essa severidade das agências? Há dois anos, elas não viram nada chegar e davam classificações convenientes a economias que viriam a ser demolidas pela crise. Essa lembrança é traumatizante.
O erro das agências remonta à criação do euro. Elas acreditaram então irrefletidamente o que todo o mundo acreditava e que os "sumo sacerdotes" da Europa apregoavam: a zona do euro era uma maravilha.
Naquela época, as agências chegaram a colocar os países periféricos (Grécia, Portugal, etc.) em pé de igualdade com a Alemanha.
O despertar foi amargo. O conto de fadas da zona do euro rapidamente azedou. Em vez de a moeda única provocar uma convergência de todos os países da zona, cada país continuou seguindo seus próprios impulsos, uns como a Alemanha para o alto, outros para o precipício.

publicado no Estado de S. Paulo
tradução de Celso M. Paciornik

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