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"WikiLeaks para sempre"

por Rogério Simões

A libertação em Londres, sob fiança, do fundador do WikiLeaks foi mais um dramático capítulo na saga envolvendo o polêmico site de vazamento de informações. Três semanas depois do início da divulgação de milhares de mensagens sigilosas da diplomacia dos Estados Unidos pelo site de Julian Assange, apenas uma coisa é certa: o WikiLeaks, ou pelo menos a atividade à qual ele se dedica, veio para ficar. Segredos de Estado nunca mais estarão tão seguros quanto antes, diplomatas aumentarão o cuidado com o que dizem e/ou escrevem, e governos se prepararão melhor para reagir à exposição de suas verdades. Hackers protestaram contra a prisão de Assange entrando em áreas sigilosas de sites de empresas financeiras que o abandonaram, numa mostra da fragilidade do mundo virtual. A tecnologia digital criou uma nova realidade, de espionagem e contra-espionagem, invasões de sistemas e bancos de dados, da qual parece ser impossível escapar.
O vazamento das mensagens diplomáticas americanas, sobre os mais diversos assuntos, foi chamado por alguns de 11 de Setembro da diplomacia, um episódio de implicações imediatas gigantescas e consequências futuras incertas. A dura reação de políticos após o vazamento, com o WikiLeaks perdendo apoio logístico de empresas (Amazon, Mastercard, VISA) e a polêmica prisão de Assange sob suspeita de abuso sexual mostraram que muita coisa estava em jogo. O fundador do WikiLeaks diz que seu objetivo não é apenas revelar segredos dos Estados Unidos. Sua luta, afirma, é pela liberdade de informação quando segredos protegem grandes interesses, políticos ou econômicos. Mas seus críticos dizem que a exposição de segredos de forma pouco criteriosa, sem uma clara justificativa editorial, ameaça a segurança de nações e indivíduos. Por enquanto, o debate parece estar dividido entre os que combatem os grandes poderes e aqueles que os defendem. A força do status quo contra uma nova geração de revolucionários virtuais. Desse ponto de vista, é fácil para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defender publicamente Julian Assange e a liberdade de informação. O Brasil é um ator em ascensão que tem pouco a perder com a revelação de documentos secretos americanos. Mas o poder e a responsabilidade brasileiros aumentam a cada dia, e o interesse nacional falará mais alto se o Brasil for um dia confrontado com revelações indesejáveis feitas por algum hacker intrometido. Quem tem pouco a perder com as ações do WikiLeaks hoje pode ser seu inimigo amanhã.
Como em qualquer outra atividade humana, no atual conflito entre o site de Julian Assange e o poder tradicional alianças são feitas e desfeitas, laços se rompem com a mesma rapidez com que são formados. Um porta-voz do WikiLeaks, Daniel Domscheit-Berg, decidiu deixar o site por divergências com seu chefe famoso e criar o OpenLeaks, a ser lançado em breve. Domscheit-Berg afirmou não concordar com as direções tomadas pelo site de Assange afirmando, ironicamente, que no WikiLeaks há "muita concentração de poder". Depois de enfrentar o poder de superpotências mundo afora, Julian Assange parece ter encontrado resistência ao seu próprio, o que só prova que a transformação trazida pelo WikiLeaks é muito maior do que ele mesmo.
Outros sites, outros questionadores do status quo estão chegando, prometendo formas ainda mais eficazes de quebrar estruturas tradicionais, romper barreiras erguidas pelo poder e disseminar questionamentos e incertezas. Assange pode ser condenado por um suposto crime sexual ou mesmo eventualmente responder a acusações de espionagem nos Estados Unidos, como se especula. Seu site pode inclusive fechar as portas devido a pressões ou falta de recursos. Não interessa muito. O WikiLeaks, como fenômeno, como ferramenta inspiradora de abalo do poder, veio para ficar. Sua forma de atuação, adotada por outros, será uma realidade inerente às tecnologias abraçadas pela humanidade neste século. Os muros de Roma já foram derrubados, resta agora ao poder tradicional aprender a conviver com os bárbaros.

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